💛 Brasil com S ou com Z?
Hello, Upper Brandside. Sou eu, a Unbriefada, sua nova colunista misteriosa.
E sua única fonte confiável sobre os bastidores do branding contemporâneo. Ou, pelo menos, daquilo que ainda tem um pingo de identidade.
Essa semana, enquanto você via mais um TikTok de influenciador ensinando como ganhar dinheiro com tigrinho (alô, CADE?), eu fui buscar respostas mais profundas: qual é, de verdade, a cara do Brasil?
SPOILER: não é a estampa de onça nem o filtro em verde e amarelo que aparece de quatro em quatro anos.
🧷 Alfinete no Ego
Ou você ama o Brasil ou ainda não fez as pazes com suas raízes.
A tal da síndrome do vira-latas (termo cunhado por Nelson Rodrigues para descrever o complexo de inferioridade cultural dos brasileiros em relação ao que vem de fora) ainda assombra muito brasileiro. E, pior, escorre pelas campanhas de grandes marcas nacionais e pauta o feed de influenciadores que dizem "valorizar o nosso país" enquanto fazem publi com queijo brie, look importado e legenda em inglês.
Enquanto ainda vemos esse comportamento anti-Brasil travestido de sofisticação importada, ares de mudança começam a soprar do lado de cá do Equador.
Não só em forma de trend no TikTok, mas em sinais sutis e poderosos de que talvez o Brasil esteja começando a se olhar com mais generosidade e desejo de pertencimento.
Em 2022, a agência Ana Couto lançou o estudo "Branding Brasil" e revelou um dado que fez a gente levantar a sobrancelha com orgulho: 58% dos brasileiros sentem saudade de usar algo com as cores do Brasil.
Não é só nostalgia. É desejo de se reconectar com algo que foi sequestrado por estereótipos e polarizações.
E sabe quem percebeu isso? Nada menos que Angelina Jolie, a Lara Croft original, que resolveu trocar o tapete vermelho do Oscar por um chão batido de terra vermelha.
Em abril de 2025, a atriz desembarcou no Brasil com foco em direitos humanos, ativismo ambiental e moda sustentável. Conheceu lideranças indígenas no Xingu, visitou organizações que apoiam imigrantes e refugiados em São Paulo, e ainda negociou a abertura do Atelier Jolie por aqui: um espaço de moda autoral que valoriza o artesanal e talentos locais.
Sim, enquanto a elite criativa do Brasil ainda associa identidade nacional a samba & feijoada no rooftop, Jolie estava tomando café de coador com bordadeira no interior e conversando sobre design regenerativo com estilistas brasileiros.
Enquanto muito brasileiro ainda acha que cultura é o line-up do Lollapalooza, Jolie foi lá e colocou grana (e tempo!) em projetos ligados à preservação, educação e fortalecimento das culturas originárias. Quem diria que a sensatez viria direto de Hollywood, né?
E falando de Holywood, o Oscar desse ano também teve ares bem brasileiros.
Pela primeira vez em anos, tivemos uma produção inspirada em um livro brasileiro com protagonismo político e emocional de peso: "Ainda Estou Aqui", de Marcelo Rubens Paiva. Uma história de ditadura, memória, amor e resistência que trouxe o Brasil para o centro da conversa internacional sem precisar tocar pandeiro.
E quem brilhou no palco foi Fernanda Torres, que deu um show de carisma, presença e profissionalismo. Com ela, o Brasil apareceu além das bundas rebolando no tum tum tum do funk. Sem negar a batida, mas mostrando que também somos poesia, ironia, história e força narrativa. Porque o Brasil é múltiplo. Vai do batuque à biblioteca, do meme à memória.
E, pasme: ninguém precisou usar estampa tropical nem vender clichê pra parecer "autenticamente brasileiro".
Talvez o mundo esteja mais preparado pra ouvir o Brasil... agora só falta o Brasil estar pronto pra falar de si sem vergonha da sua história.
🧃O Puro Suco do Branding
Falar de Brasilidade no branding não é colar arara, coqueiro e maracatu no moodboard e chamar de conceito. É saber traduzir em expressão o que pulsa nesse território múltiplo, contraditório e profundo. É sair da estética de feed e entrar em uma ética de construção simbólica.
Brasilidade não é só briefing tropical.
A brasilidade virou tendência e isso ironicamente é um perigo. Porque quando um valor vira tendência, ele corre o risco de ser esvaziado e pasteurizado para caber no grid. Tem marca vendendo "Brasil real" com paleta Pantone do verão europeu e trilha sonora gringa com legenda "autoral". Só que brasilidade de verdade tem sotaque, memória, rastro de poeira no sapato, cheiro de café passado na hora e contradição.
Lá em 2011, muito antes do TikTok ensinar a fazer storytelling com transição de skincare, a Box1824 lançou o estudo "O Sonho Brasileiro da Política". Nele, descobriu-se que 89% dos jovens brasileiros sentiam orgulho do país e 75% acreditavam que o Brasil estava mudando pra melhor.
Ou seja, mesmo sem feed estético e sem planner com fonte serifada, já tinha uma geração tentando amar esse país com todas as suas contradições. Eles ainda nem sabiam, mas já queriam pertencer a algo que fizesse sentido. Spoiler: esse algo não era o Brasil de briefings em inglês nem de paleta "leblon chic".
Só que a publicidade preferiu continuar contando um Brasil que só existe no PowerPoint das agências: tropicalizado demais pra parecer exótico, pasteurizado demais pra caber. E aí esse jovem, que tem orgulho do Brasil mas também crise de ansiedade e senso crítico, olha pro outdoor e pensa: quem é essa galera de roupa bege falando em ancestralidade com cacto cenográfico?
Porque os jovens de hoje, especialmente a Geração Z, com seu radar afiado pra hipocrisia e dedo nervoso no repost, não querem só identidade visual. Querem identidade com história, com alma e com CPF emocional. Querem se ver nas campanhas sem precisar se identificar com uma versão exótica, caricata ou exportável de si mesmos. Querem presença com verdade, não personagem com filtro. E de preferência, sem legenda em inglês explicando o que já estava claro em bom português.
Mas fica difícil quando a narrativa que nos vendem ainda é feita por quem nunca pegou um busão pra fora do eixo Rio-SP ou se deu ao trabalho de conhecer os sabores, os sotaques e os cheiros que compõem esse Brasil afora.
Mas vamos olhar pro lado bom da história e exaltar quem está fazendo o dever de casa com excelência tropical e identidade de verdade.
A Misci, marca criada pelo mato-grossense Airon Martin, é uma aula viva sobre branding com repertório, raiz e afeto. Desde sua fundação, a Misci vem se destacando por costurar uma narrativa de Brasil profundo, fugindo da estética pasteurizada e elevando elementos regionais a um patamar de arte e sofisticação.
Airon já declarou em entrevistas que vê a Misci como uma "marca de identidade brasileira, e não de estereótipos." Suas coleções misturam alfaiataria com renda renascença, palha, crochê e técnicas artesanais de diferentes regiões do país.
A marca, aliás, já conquistou guarda-roupas de nomes importantes da cultura brasileira e continua desfilando autenticidade pelas passarelas e campanhas.
Em uma publicação recente, Airon cravou:
"Eu queria sim ter nascido em Paris. Eu não precisaria me desgastar tanto para mostrar que o que fazemos é excelente, pois lá eles se reconhecem. Mas lá eu não teria a mesma consciência social e nem teria passado pelo que o Brasil e suas complexidades me fazem passar. Sou filho do Brasil, amo meu país, e não romantizo minha história aqui. Gostaria sim que ela tivesse sido diferente. Por isso estou aqui, e luto, torço para gerar algum impacto positivo numa parcela mesmo que pequena, mas tão importante da sociedade (…)"
É esse tipo de posicionamento que transforma uma marca em manifesto. Que mostra que identidade não é lookbook, mas sim coragem de contar uma verdade, mesmo quando ela não está na moda.
Aqui na Unboring, a gente vive o Brasil original. Aquele que não está nos holofotes das agências da Faria Lima, mas sim nos detalhes da fala, no olhar pro interior, no respeito pelas histórias que não cabem em briefing.
Foi com esse olhar que tivemos a honra de cocriar o branding da Tisú: uma marca que vai desembarcar em Los Angeles com identidade, carisma e raiz. Inspirada na paisagem do Lajedo do Pai Mateus (PB), suas peças ganham nomes em tupi-guarani e são verdadeiros mapas afetivos do Brasil profundo. Uma marca que não romantiza a origem: ela celebra, investiga e transforma.
Porque quem faz branding de verdade entende: paleta de cor não resolve ausência de identidade.
🕳 Gabinete de Curiosidades
Enquanto muita gente ainda recorta referência de Pinterest e acha que colar uma folha de bananeira no branding já é o suficiente pra parecer autêntico, eu fiz o dever de casa.
Essa curadoria nasce da fome de conhecer um Brasil que ainda não virou trend, mas que pulsa, produz, escreve, borda, canta e faz cinema com alma. Cases nacionais, livros que ardem em sotaque e documentários que não cabem no eixo Rio-SP. Tudo aqui foi escolhido a dedo (sem ajuda do algoritmo, tá?)
Documentário "Caminhos da Mantiqueira" - disponível aqui
Uma imersão poética nas montanhas que moldam histórias, modos de viver e saberes do interior.
Fabiana Guimarães e sua Newsletter
Na última edição da sua newsletter "Tristezas de Estimação" (disponível aqui) Fabiana escancara o apagamento que autores fora do eixo Rio-SP enfrentam na literatura nacional. Goiana-brasiliense, ela escreve com a lama da terra e o faro do Cerrado. Seus romances Como se fosse um monstro e Apague a luz se for chorar são verdadeiros manifestos de identidade. E seu próximo livro, que sai pela Alfaguara, promete continuar cutucando com a ponta afiada da caneta o preconceito estrutural contra a literatura que vem de dentro do Brasil
Filme "Homem com H" - estará disponível no catálogo da Netflix a partir de 17 de junho
Um retrato potente da vida e da transgressão estética de Ney Matogrosso. Porque brasilidade também é performance, disrupção e resistência.
Documentário "Ritas" - disponível nos principais cinemas
Uma ode à Rita Lee e a todas as Ritas que ousaram desafiar padrões. Uma aula de irreverência, criação e força feminina dentro da cultura pop nacional.
Livro "Dicionário do Folclore Brasileiro - 70 anos" de Câmara Cascudo - disponível aqui
Uma obra monumental que reúne mais de 60 mil verbetes sobre o imaginário popular do Brasil. De crenças a brincadeiras, de comidas típicas a expressões regionais, esse livro é um verdadeiro mapa da nossa cultura oral e simbólica. Ideal pra quem quer entender a alma do Brasil sem filtro nem Photoshop.
Marca Dengo Chocolates
Mais do que chocolates, a Dengo oferece uma experiência que valoriza o cacau brasileiro, promovendo sustentabilidade e impacto social positivo. Com lojas no Brasil e na França, a marca mostra que é possível exportar o sabor e os valores do nosso país.
Marca Linus
A Linus é conhecida por seu design sustentável e por valorizar a flora e a fauna brasileiras de uma forma que foge do óbvio. Recentemente, a marca lançou uma colaboração com
, estrategista de branding e fundadora da . Juntos, criaram o boné "Muitas Abas Abertas", uma peça que simboliza a criatividade e a multiplicidade de ideias que movem os profissionais de branding. Essa parceria reforça o compromisso da Linus em unir estilo, sustentabilidade e narrativas autênticas.
🫦 Pra quem chegou até aqui...
E se depois de tudo isso você ainda quiser colocar uma palmeira na logo e dizer que sua marca tem "alma brasileira", tudo bem. Só não esquece que brasilidade não é filtro de Instagram: é território, memória e contradição.
Um beijo, um batuque, e aquele shade carinhoso de sempre.
🫦 Compartilha com quem ainda acha que o Brasil se traduz em briefing tropical.
Aviso de utilidade criativa pública:
Se você entendeu as entrelinhas, riu com um leve desconforto e pensou: "preciso mandar isso pra aquela marca que romantiza o Brasil mas nem sabe onde fica o Jalapão", bem-vinda ao meu clubinho não convencional de branding.
E aqui, diferente das campanhas que só lembram do país quando é conveniente, a gente faz branding com dendê, ideia e uma pitada de insolência editorial.
Mas se quiser se sentar com a gente, é simples:
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Porque no branding de verdade, quem silencia a própria origem... vira tendência esquecida.
Quer comentar, discordar com elegância ou indicar uma autora do Cerrado que nunca foi lido pelo Sudeste? Minha DM tá sempre aberta e meu olhar, sempre alerta.
Essa newsletter foi só uma colherada… No Instagram da Unboring tem o suco do branding servido todos os dias, sem rótulo genérico, com alto teor de identidade e zero açúcar refinado.
Nos vemos daqui 15 dias — com mais alfinetadas, menos estampa clichê e um repertório que nem o ChatGPT poderia prever.
Você sabe que me ama, mesmo querendo me cancelar.
Xoxo,
Unbriefada